terça-feira, abril 22, 2008

Campo aberto

Nada mais comum que o homem pense sobre seu próprio tempo dando-lhe um papel especial sobre os demais momentos da história. Isso ocorre tanto nas mais elevadas e pretenciosas formas de pensar como nas mais simples e comuns, e por constituir uma forma tão comum e muitas vezes util de lidar com os fatos não irei condenar esse complexo de épico. Apenas gostaria de apontar parao outro lado, para a contigência especifica de cada momento, para a aventura agônica de viver e atravessar o espaço entre o berço e o tumúlo colhendo perçepções, vivendo do interior da própria vida com o que pomos nela er com o que ela nos põe ( e essas duas coisas não estão separadas). Com isso eu quero muito pouco. Afastar os idólos de pedra ensaguentada, os mitos sobre humanos, e deixar o campo aberto, para semear e partir sem esperar pelos frutos.

segunda-feira, abril 14, 2008

Para proseguir, ensaio de um pragmatismo romantico.

A vida pode não ser uma perspectiva sombria. No final das contas nos pegamos vivendo um dia de cada vez e percebendo que isso é a melhor coisa que pode acontecer, embora isso não exclua os mais audaciosos planos e projetos. Veja bem: é só uma questão de dimensionar a referência de nossos anseios. Somos homens e caímos na vida sem saber se existe ou não algum projeto inicial, de onde viemos e para onde vamos, e talvez essa dúvida seja a parte mais importante do projeto, ou da falta de um. Somos finitos. Cada segundo de vida é um passo de dança a beira de um abismo no qual se perdem os nossos pensamentos. Mas ainda assim dançamos, pois o abismo é apenas um limite para nossa coreografia e não a determinação de como iremos dançar. É uma coisa puramente formal a morte. Sabemos que ela virá, sem sabermos nada a seu respeito exceto que é um limite. Alguém disse que a morte não afeta em nada nosso ser pois ela vem de fora, de fora das teias de relações no interior das quais existimos. Penso, se isso servir para alguma coisa, que devemos portanto sondar nossos passos de dança na perspectiva desse fato, o de que morremos, sem tentar extrair certezas dele, (isso seria ignorar que além da morte existem outros limites tão intransponíveis quanto aquele.) e que se formos simplesmente seguindo sem perder a consciência acerca desses limites , teremos um vida boa e digna mesmo que isso seja bem diferente para cada pessoa.
Há uma certa fatalidade positiva nisso tudo, sim, porque a fatalidade pode ser boa ou ruim. Há coisas que quando aceitamos se tornam mais simples, nossos desejos tem essa natureza. Lutar contra eles é terrível, aceitá-los– o que implica mais que satisfazê-los- nos alivia de um fardo, e libera energias para ir em frente deixando brotar novos desejos. Aceitar as condições concretas de nossa existência– por mais vago e absurdo que seja isso - tem um certo “quê” de um pragmatismo romântico, pois nos permitiria ultrapassar o que é aceitando-o e nos movimentando em seu interior, deixando exibir-se “o que aparece” como dizem os céticos, deflacionando o ideal e mantendo-se atento a contingência do momento.
Sacudir o pó da inércia e da certeza, ir em frente assumindo risco e abandonando culpas: não seria isso já uma espécie de romantismo? Não estabelecer nenhuma meta descolada do presente, da historia da relação que se estabelece entre nossos interesses atuais e o mundo ao redor: não seria isso uma forma de pragmatismo? Veja meu amigo, eu lhe falo como um homem que também quer continuar, e essas palavras se dirigem muito mais a mim que a você, mas também meu coração tem em ti alimento por isso me realizo duplamente ao ver nos teus olhos o meu reflexo e o mesmo anseio.
Os filósofos, penso, levam demasiado a sério os seus pensamentos, os místicos levam demasiado a sério as suas dores, e nós, que não somos nem filósofos nem místicos, oscilamos entre o medo contingente da dor e as canonizações eventuais do pensamento. Por isso, creio, não podemos nos jactar de uma superioridade em relação a aos filósofos nem aos místicos, pois assumimos ocasionalmente a mesma forma de vida deles, nos alimentando inclusive do que eles produziram, nem podemos nos sentir inferiores, pois é para nós que se dirigem seus trabalhos e é a nós que eles tentam convencer.
Talvez alguns destes grandes homens estivessem certos, talvez um dia venhamos a descobrir que deveríamos ter abandonado as demandas e solicitações do mundo nadado contra a correnteza, mas não vejo como artificialmente transmutar em fato uma hipótese, e viver por suposições e relações entre um pensamento e outro. Por isso irei seguindo, desviando pedras e das dores e incrementando a obviedade da sobrevivência com alguma estética ou mesmo alguma metafísica.