sexta-feira, dezembro 23, 2011

Menção a uma interrogação oceânica.

Talvez as coisas partidas
Possam refletir a ausência de nexo
Que persiste na essência do mundo.
Talvez seja esse o segredo:
ela traz no
Sorriso um pedaço de luz,
Um valentia que me assombra
Uma beleza que desafia
O infinito.
Exata, perene e confusa
Ela fere em seus gestos de
Fome,
Torrente de anseios projetados
No céu,
Plêiade onírica de afetos suaves
Que me recebem, me curam,
me afirmam.
Espírito dos oceanos intensos,
Guardas um segredo fascinante
Para minha alma de barqueiro ansioso.
Talvez eu naufrague nas ondas,
Pobre trama de recuo hesitante
Jogado de encontro ao feminino
Mistério.

sexta-feira, dezembro 16, 2011

Sonata noturna durante o assassinato de um cão.

A raiz da maldade não está nas ruas,
Não está na arma do criminoso
Não está na bomba do suicida
Não está nas manchetes do telejornais
Não está nos presídios.
A raiz da maldade não pode ser vista
Repousa silenciosa sob a superfície
E algumas vezes seus ramos
São lançados na luz de um dia
qualquer.
Nas famílias, nas casas, nos casamentos,
No amor, nas tristezas que cultivamos dia a pós dia
Pois nosso sofrimento possui um sabor
Tão sutil.
A escuridão prevalece em silêncio,
Camuflada por razões que nós temos
e sua natureza definitiva
É maldade.
Uma dona de casa, um pai, um amigo,
Uma paixão, uma ânsia, um incômodo,
Um propósito
Maldade
Maldade
Maldade
Está aqui
Está aí
e precisamos conviver desse jeito.
Talvez ela nem mesmo exista
De tão perene e espantosa
Tão sólida, densa e exata
que explode para dentro de si
e desaparece quando tento
tocá-la.
Perfil de lutos e estragos
Corda em que equilibro
Meu ser.

quarta-feira, dezembro 14, 2011

Na montanha.

Vou subir a montanha novamente
com as cinzas.
Lá encontro sempre um Deus sem lei
uma chama que incinera,
e uma dor brutal.
Nas montanhas lavo-me com fel,
recupero minhas armas
e retomo o trilho daqueles de alma
amarga.
Nas montanhas habitam meus troféus,
minhas medalhas conquistadas
em outras lutas contra o amor...
Nas montanhas deixo tumbas prontas,
cal, enxofre e navalhas.
Nas montanhas me refaço e me relembro
monto barricadas e sigo em frente.

‎1º valsa para um decapitado.



Um painel precisa ser pintado
De vermelho
Para que as suas flores possam
Repousar
Não é minha querida?

Por tudo isso sou culpado,
Por tudo aquilo que não sei,
Por tudo aquilo que não fiz
Por toda coisa estranha, por todo arranjo torto
Contraído,
por toda inadequação ao sonho
pela minha insistência em querer que tudo
seja leve.

Agora vais amar, reflorescer, vivificar...
Meu amor dilacerado irá se abrigar
Nas catacumbas e meu carinho órfão
Se embebedará de fel
Como uma mariposa que se incinera
Em luto
Como um decapitado que ainda canta
Sua canção.

Sobre vontades e precipícios.

Silêncio no oco do peito:
a vida não é exata.
As palavras não são doces,
os desejos não são sábios
as coisas são complexas
mas também podem ser
desculpas.
Quem sou eu para refutar os riscos,
para ocultar ardis, para travestir-me
em santo, para aquietar os mares,
para preencher uma vida e empurrar outras
razões do precipício?
A felicidade está ali: sem rodeios.
Forte como uma alvorada, linda como uma primavera intensa
como uma colina nua, como um beijo apaixonado
como uma despedida...
Como quero o que admiro, o que preciso
o que me atormenta,
mas torto e inexato não me cabe
intercessões
sentado eu leio os tratados
do acaso.

segunda-feira, dezembro 12, 2011

Presságio.

A música fúnebre
repercute em meus ouvidos...
O som do vento?
Há quem diga que a vida
não é senão uma grande
despedida.
Mas o que fazer se eu lancei
os meus navios no infinito
apesar dos muitos gritos
que eu trancava no porão?
Então o meu demônio estava certo,
estavam certos os veteranos
os marcados,
esses seres exilados
que recusam-se a amar.
Para aves canoras e libertas
o espaço do céu, a amplidão
para cínicos combatentes, o deserto
e o deserto meu amor...
ele sempre tem razão.

domingo, dezembro 11, 2011

Paixão existencial

Como definir meu Eu

Em sua estrutura não contextual

Em seu onírico desdobrar-se em fatos

Nos pensamentos que se sucedem

Sem ter fim.

Nas escolhas que se impuseram

Mas que fiz

Abertura imponderável para uma passagem

Cega

Cegueira opaca onde cintilam esferas

Escolhas cegas que me trouxeram

Até aqui.

Como definir meu EU

Essa trama de acasos submetidos aos consensos

Essas intuições silenciosas que apreendes por palavras

Essa paixão insana que me divide entre duas

Exigências

Essa pergunta louca que se responde a si mesma...

Como poderá essa escassez abrigar-te no amplexo?

Pois não admito um EU reduzido às circunstâncias

Exilado do sentido que espalhas com seus gestos

Perdido do amor que encontro nos seus lábios.

domingo, dezembro 04, 2011

Polegadas.

Aqui e atento
perdendo o tempo que é
pouco
por incapacidade de administrar
o bom senso.
Aqui e agora,
mais velho, mais tolo
mais cansado
alguma sobrevida encontrada
algumas alegrias fabricadas
nenhum brilho mágico
exceto o do jardim.
38, e tanta luta, tanta fome
jogado de um lado ao outro
sem muita alternativa
exceto essa chama louca
que insiste em ficar viva.
Muitos livros para ler, pensamentos
a considerar,
e amores a perder
(No amor nunca vi ninguém
ganhar.)
Aqui, ainda na trincheira,
mensurando dimensões em polegadas
esperando pela condenação do julgamento
ou pela assimilação do nada.