sábado, janeiro 31, 2009

Rancor.

A culpa é o seu argumento...
Queimar cidades que não se curvam a teu poder.
Dias destroçados de lamuria,
rancores semeados
Pela tentativa vã de erguer-se
ao patamar de uma antiga condição.
A pulverização do brio,
A vingança a qualquer custo,
A consideração movida pelo desejo de fugir
à condição finita que nos determina a todos.
que nos determina a todo
se você consome o breve tempo destinado
em horas arrogantes de resgate do passado

quinta-feira, janeiro 29, 2009

Sentenças - Um estudo topológico do abismo.

Pequenos grãos de poeira voavam no quarto quando acordei. O leve mal estar da bebedeira e o conhecido sintoma da falta de meta. Exausto, mastigado e sem qualquer prerrogativa.
Sonhar nunca foi um anestésico desejável para os meus cancros. Terminações do inacabado e opressões simbólicas que não alimentavam minhas trincheiras com sentido. O remorso também é uma alegação vazia, um fantasma desenvolvido por professores sem competência para a vida. A dor passada e o medo de sua recorrência é que se encarnavam quando a benção da noite sem delírios não me acobertava. O dia que me esperava poderia trazer uma nova aurora, o reconhecimento contingente de outras linhas que, a semelhança destas, escrevi entre catarses contingentes de dramas revividos. Haveria a entrevista, eu talvez fosse confirmado, não havia outra possibilidade maior de sobreviver com brio, pagar as contas e talvez, quem sabe, mostrar a minha filha que o pai dela não era um completo fracassado. Mas havia o medo, havia o inevitável, havia a incerteza que sempre fiz questão de admitir. Olhei firme para o canto da casa e podia jurar que havia alguma coisa movendo-se na sombra, algo esperto, malicioso planejando a próxima jogada para esmagar-me o nobre coração. Lancei-lhe uma cusparada em desafio e saí para comprar cigarros e algum repasto atravessando a turba das vozes que se misturavam ao sol do meio dia. As pernas estavam doendo e sinceramente não sentia nenhuma disposição para ser sociável, portanto, procurei o mais vazio dos mercados. Perdi alguns minutos nesse processo e outros tantos olhando as prateleiras e pensando no que comer, sem conseguir estabelecer uma média ponderada entre o melhor prato para o meu refinado paladar e o preço acessível aos trocados que trazia no bolso da calça desgastada.
Às vezes tenho a estranha sensação de que todos estão me observando, e tentando (por algum sórdido motivo) chamar minha atenção. Uma senhora imensa, com o cabelo coberto de rolinhos de papelão parou do meu lado e começou a falar dos preços, da qualidade das mercadorias e do atendimento do mercado. Vespas gigantescas não me dariam tanto medo, invasões alienígenas não me dão tanto medo, patrões obesos e suas esposas viajando de iate em um ensolarado final de semana não me dariam tanto medo quanto pessoas que falam sozinhas. Abrigo-me no requisito que mais prezo em uma democracia, o direito A SACROSSANTA INDIFERENÇA. A mulher me olha uma, duas, três vezes, desiste e vai procurar uma outra vitima. Eu me resolvo pelo molho de tomate, macarrão e algumas lingüiças. A garota que passa as mercadorias recorre a estratégia da invisibilidade sorridente, no gesto pago meramente objetivado ela se salva da possessão alheia. Cada um quer o seu feudo, e as pessoas amáveis são as piores. O seu olhar escorre para dentro de si em um ódio calado e sorridente. Penso que o mundo seria muito mais suave, as estradas seriam mais abertas se não houvessem tantas exigências penumbrosas, tantos círculos confusos para chegar ao mesmo ponto de partida. Como nos casamentos por exemplo. Energia gasta, tesão desperdiçado automutilação inútil. E eu me ponho a pensar na minha utopia: “Senhor Juan Leon, no quesito desempenho sexual o senhor contemplou as exigências do contrato, mais nos tópicos seguridade social, previsibilidade afetiva, exclusividade corpórea e apresentabilidade social o senhor realmente não foi bem avaliado e terá de ser demitido desta relação” Simples direto e sem meias palavras. O fim do absolutismo na vida das pessoas. Tangibilidade e espaço para soluções mais rápidas. Aleluia Huxley!
Chego ao desterro pequeno e abafado do meu quarto, carregado destas palavras absurdas e destas parcas e vergonhosas compras. Os livros estão por toda parte, assim como as revistas masculinas, os rascunhos mal acabados de possíveis contos e poemas e recibos nunca pagos que me levarão para o abismo. Coloco a água do macarrão no fogo, separo as lingüiças com uma faca em pequenas rodelas e faço o mesmo com as cebolas. Frito tudo no óleo e aguardo que a água ferva enquanto ouço um Hank Wiliams colocando uma fumaça no juízo e acompanhando o Krishnamurti em sua tentativa. Nada de tentar resolver. Nada de tentar não tentar. Afinal de contas, seus infelizes, vocês vão ou não vão encarar QUAL É MESMO O PROBLEMA? Bom, muito bom. A água ferve, jogo o macarrão lá e fico misturando para evitar o grude. O satanás do macarrão. Queimem seus infelizes, cozinhem no meu fogo, derretam seus corpos esbeltos de farinha de trigo hahahaha. O macarrão chega ao ponto, lavo a massa em um encardido escorredor plástico, jogo a coisa toda no meu prato, cubro com o molho pronto comprado por trocados e laureio minha obra com as rodelas de lingüiça engorduradas. Um manjar. Coca-cola para minha ulcera e tudo está perfeito.
Acabo com a minha criação em algumas garfadas. Uma metáfora perfeita do que é viver, e só me resta terminar o trabalho soltando a massa marrom e desprezível no vaso sanitário. 15:00 horas. Aproxima-se o horário do fatídico resultado. Será Juan Leon publicado finalmente? Será o romantismo trágico refutado pela contingência desejada da democracia? Leitores para quem não traz consigo as credenciais? Eu quero ter meu pessimismo refutado e também não vou dizer que é nobre. Vou para o chuveiro e esfrego bem as partes, mas não me masturbo, poderia dar azar, é melhor não arriscar a essa altura do campeonato. Quase chego a rezar... quase. Vestido com uma puída calça jeans e uma camisa social desbotada me atiro novamente as ruas.
Após atravessar metade da cidade chego ao reluzente centro empresarial onde as rapinas de gravata decidem o destino das ratazanas estropiadas. O edifício da editora perde-se na imensidão do espaço. Uma torre inimaginável, um castelo cercado pelos fossos de tradições herdadas, de filhos que seguiram os seus pais, de pais que seguiram os pais deles, de acumulação determinada pelo medo e eles tem razão. A vida oferece as premissas para isso e eu não posso refutá-los, todavia, estou situado em uma posição desvantajosa e por isso os desprezo. Desprezo a sua falta de criatividade, o seu senso de acordo, a convicção de seu parco senso do que é viver... áridos desertos, mais não é culpa do dinheiro e sim da preguiça alimentada com o leite tenebroso da família. Mas preciso da migalha deles e por isso estou aqui. O recepcionista me olha com suspeita e me mostra o elevador. O que há com esse cara? Nunca viu um escritor? Que tolice a minha, esqueci repentinamente que agora os escritores falam sobre “caminhos sagrados de Santiago Compostela” “como ficar rico sem fazer esforço” e vestem ternos bem cortados ou descontraídas blusas brancas sem estampa no calçadão de Ipanema.
Chego ao escritório no 26° andar e uma secretária linda me recebe. Peitos formidáveis. Como uma juventude sadia fazendo amor em prados verdejantes e redenção absoluta em um gozo apenas, mas ela estraga tudo me olhando com desprezo. Eu me apresento, ela me pede para sentar e eu espero tremulo pela minha sentença.
A porta se abre. Um sujeito cheio de trejeitos femininos sai da sala com um ar blasé. È isso que é ser um escritor hoje em dia? A garota chama meu nome e diz que eu posso entrar. Minhas pernas quase não respondem. Os supermercados não estão oferecendo vagas. Não tenho contatos que possam me conseguir um emprego como professor. Já não tenho idade para carregar os fardos de farelo que me permitiram alimentar a minha filhinha até os sete anos. Talvez essa seja minha ultima chance. Atrás da imensa mesa um sujeito mais redondo que eu ocupa o centro de uma sala repleta de livros enfileirados nas paredes. O cabelo grisalho meio despenteado tenta me convencer de que ele é um sujeito comprometido com a cultura, mas os vincos de sua testa insana me mostram que na verdade quais são as suas verdadeiras intenções.

- Sr, Juan Leon, Avaliamos os teus contos e devo lhe confessar que estou surpreso. São muitos bons

Eu gelo. Será que finalmente alcancei o meu lugar? Então é isso? Sim, Sim, agora percebo que tudo faz sentido. Ah! Como fui tolo duvidando, era só um experimento para burilar minha palavra, sim, sim um longo e tenebroso sonho do qual despertei agora. Mas ele não tinha terminado ainda.


-Todavia, não temos mercado para o que escreves.

O chão desaparece sob os meus sapatos, o frio toma conta de meu peito enquanto ele desfia seu rosário de observações prudentes sobre o iluminismo, a internet, auto-ajuda e os manuais. Após perceber que já não há mais solução, que eu sou antiquado e ressentido em demasia para ser assimilado eu balbucio a minha sentença interrompendo seu brilhante raciocínio.

- É que nos falta uma hecatombe nuclear.
-Como? Desculpe Sr Juan, não entendi.
- uma Hecatombe, sabe? Pessoas sendo queimadas nas ruas como papel sequinho, sabe? Brancos, negros, pobres, ricos... Todos, sem exceção. Queimado, tentando salvar suas peles sem pensar em mais nada. É o que falta para que algumas coisas tornem-se relevantes. Não que eu deseje que isso aconteça, claro, é apenas uma observação solta. Bom, tenho que ir, uma importante editora americana mandou-me uma carta dizendo que eu sou a maior descoberta literária depois de Hemingway.

Levanto da mesa do meganha e o deixo lá estupefato. Ao passar pela secretária peituda deixo escapar baixinho.

- Quando quiser chupar uma pica de verdade me telefona
Desço o elevador e a rua me recebe como uma puta louca sedenta do dinheiro que não tenho. Ela não me perdoará. Me cortará os membros e eu terminarei meus dias me arrastando com um pequeno molusco a me alimentar de excrescências. A mundo rodopia. Meu corpo cresce e encolhe como uma bola de soprar. Sento em um meio fio com a cabeça entre as pernas esperando o despertar que nunca chega, o fim da longa noite que pode não trazer alivio.

Eu não sou um escritor !

Eu não sou um escritor. Um escritor tem um plano, uma técnica, um discurso. Um escritor tem uma visão geral de mundo que ele tenta tornar concreta através de suas palavras. Um escritor tateia, anda as cegas no mundo, esbarrando nas obrigações que ele impõe, tentando delas se esquivar porque ele sabe que tem que escrever, e algumas vezes, sabe até “o quê” ele tem que escrever. Um escritor tem uma linha estável de temas e de formas. Ele acha que encontrou a maneira mais digna e apropriada de escapar da morte que nos ronda a todos. Quem se afeiçoa a um escritor, abre um de seus livros e sabe mais ou menos o que vai encontrar. Não, eu acho que não sou um escritor, eu sou mais parecido com um lutador de boxe. Sei que as pessoas que tem na leitura um prazer ou um ideal, que suspiram e se elevam ao ter um livro diante do olhar, não gostarão dessa comparação. Sei também que algumas pessoas em geral consideram o boxe uma barbárie, uma estupidez que deveria ser abolida do cosmos. Eu também acho. Mas e o funcionário da empresa de limpeza que recolhe nosso lixo? E o policial que todo dia oferece o peito às balas? Não deveriam essas profissões serem extintas? Mas elas servem aos nossos interesses, e é isso que está em jogo ao condenar o boxe, portanto eu não condeno.
Concordo com o velho F.X. Toole quando ele disse que o boxe tem algo de contrário a natureza. Quem sobe em um ringue ao invés de fugir da dor, vai de encontro a ela. Ele avança na direção do medo, fixa as pupilas no que lhe pode destruir, balança e se move ao invés de ficar petrificado pelo horror. Concordo também com Myke Tyson. Quando sobe em um ringue, todo homem tem um plano, até levar o primeiro soco. Eu procuro não ter planos. Sigo de pé, observo o que está acontecendo e tento reagir a contento. Mantenho-me em sincronia com as imposições do agora, sobrevivo como posso e registro tudo em um limbo não pensado que vai se transformar em palavras para rebater o ataque geral das coisas. Também não tento me esquivar ao fato de que sou eu sobrevivendo como posso, berrando minha dor para suscitar aliados e forças ocultas que em mim mesmo. Se eu inspiro sei que a platéia irá me levar para frente. E se for útil para eles, tanto melhor. Seremos honestos e companheiros. Eu escrevo como quem luta, e convoco cada pessoa a viver as próprias lutas com o que escrevo. Por tudo isso eu acho que não sou um escritor, eu sou um lutador de boxe. Eu carrego a marca das pancadas e preciso olhar de frente o medo para colocar meu sangue no papel. Todo boxeador um dia cai. Todo lutador tem um adversário esperando para derruba-lo, tudo que ele pode fazer é adiar esse dia, e dar um espetáculo ao publico enquanto isso.
Meus contos falam sobre desemprego, solidão, crises conjugais, traições, morte, responsabilidade. Tento não ser doce nem repulsivo. Pretendo apenas vier meus dias e me manter desperto para não ficar imobilizado pelo medo. As vidas que relato são a minha vida refletida por mim mesmo, desdobradas em outros nomes que passaram pela minha história. Quando estou escrevendo eu só tenho a mim, e ao meu desejo de compartilhar e oferecer algo a quem está me confirmando ao ler o que eu escrevo. Eu espero estimular alguém a cantar seu próprio canto, a lutar sua própria luta: Eu sou um lutador de boxe!

quarta-feira, janeiro 28, 2009

Versos para meu cancro

Você pensa que foi uma vitima?
você acha que não vale a pena?
Você espera algo que não sabe o que é
e se queixa de não conseguir alcançar?
você chora?
você lamenta?
sente-se ao cair da tarde um pobre e desprezado
quase nada sob os raios indiferentes do crepuculo?
Eu tenho um cancro que supura toda noite,
ele fede, doi, é duro e terrivel...
Ele odeia as pessoas,
ele despreza a esperança,
Mas aprendeu a cantar.
E seu canto é tão doce...
E parece tão tolerante com tudo..
mas nunca deixou de ser um cancro horrendo explodindo em pus,
ele está tão exposto a tudo..
Sua carne viva apodrecida
se irritando e maldizendo até mesmo
a luz do sol.
Mas eu não tenho pena do meu cancro
você tem do seu?

domingo, janeiro 18, 2009

Mêdo

As pessoas tem mêdo.
Erguem-se as baricadas e espelham-se nas multidões,
Epiderme de espuma montada sobre gravetos,
Por esse pequeno e asmatico motivo elas gritam
E gritam por esse motivo.
Atropelam-se nas exigências, retraem-se nos calabouços,
Erguem-se
No movediço.
Esperando,
Cobrando,
Vigiando,
Vingando-se com as unhas sujas
Da palavra.
Sim, as pessoas tem mêdo.
Mêdo de ser e de não ser,
Da grandeza e da pequenez
O peito exposto para o olhar subjetvo
E o ódio permante contra o que não estava lá.
Se denunciam no silêncio, estropiam pela força, revidam
De muitas formas
De muitas formas eles revidam,
Mordendo-se em bons bocados.
Em suas faces, em suas vozes, na afetação de seus sorrisos,
No resultado vaidoso de uma ponderação reticente,
Eles se mostram pra mim,
E mostram-me apenas mêdo.

domingo, janeiro 11, 2009

Vamos...

Corram crianças...
lá estão os seus brinquedos.
Centopeis cerebrais de ferro, Muco artificial de enchofre,
Arame farpado para os jogos de afeto
e mêdo.
Saltem por sobre as estacas ensandecidas interminaveis
fincadas em suculentas carcaças de amanhã,
sem cuidado ou previdência,
assim foi
assim será e deve ser eternamente.
Até que os astros rolem sem centro sobre o umbigo carmico das coisas.
Crescer e utilizar machados, fertilizar antes de florir, apodrecer
pelos insetos antigos e louvaveis funerais queridos.
Aqui chegamos...
-Contradição para todos os desejos !
- Amaramento de toda viabilidade de clareza !

Trepada por obrigação, bater o ponto, um contrato, as telenovelas reforçando
toda negação humana formulada em claustros e mancomios espelhados.

Como o vale é amplo...
Uma brisa sutil percorre de ponta a ponta o caminho
daquele que se sufoca na poeira de suas cegas exigências.
O sangue coagula nas folhas por onde se arrastou
uma palavra.
E os passaros sorriem sem compreender a estupidez
de quem seguiu sobre os espinhos.

domingo, janeiro 04, 2009

Sopros

Retornei, e estou pasmo!
Ouvi em cinco dias o rumor geral
dos seres, das rochas, das cachoeiras e
plantei em meu coração sementes de possibilidade
que agora me estrangulam todos os projetos.
Ouvi a voz do silêncio (sei que consideras isto absurdo)
E pude fluir no lento pulsar dos milênios que arrastam vivos e mortos
em seu torvelhinho.
Eu mesmo quase morri.
Eu mesmo que amaldicoei a mão da vida
agora me encontro esmagado de encontro a uma palavra
sem som.
A você que agora me escuta
A você meu amigo, minha amante, meu filho e filha
mãe, inimigo (eu sei que tenho inimigos)
sangue de minha alma e parceiro de salmos e cantigas
quero diirigir agora este breve relato:
Os homens não são arrastados pelo tempo,Suas vidas não são covas de desespero e dor somente,
Não servimos a trono algum nem existe despóta sobre nossos dias,
Somos a própria força clara e inocente que se move e quer realizar,
displicente e sem nenhuma pretensão.
Aqui estamos e seguimos,a erva segue, o capim cresce
Nós continuamos.
Estamos presentes ao espetacúlo em papeis
irrefletidos,o lavrador em sua fé na terra, o policial em sua crença no poder
da força, o intelectual em seu mundo de palavras, a garota em seus sonhos de afeto
e dor e todas as outras forças que se cruzam e se despedem como brumas multicores destinadas
ao esquecimento,
pois tudo deve ser esquecido
e essa é a nossa redenção.
Enganou-se aquele que cantou a eternidade
e a permanencia,
o designio e a premiação,
eu canto a finitude e a contigência
na qual nos abraçamos e ultrapassamos
nossas formas
e esta é uma mensagem vã
que eu achei necessario partilhar contigo.