segunda-feira, junho 28, 2010

Uma piada

“És muito cínico” Ela me disse
Depois comentou a minha vasta erudição
E aquilo me soou como uma desculpa.
No outro dia foi a minha distração,
Meu modo confuso e livre de amar
Sazonalmente.
“Não serves para um marido”
É o que ela quase disse,
mas a palavra tropeçou
Em uma outra imagem mais exigente
e refinada.
“És muito cínico”
ISSO É ALGUMA MERDA DE PIADA?
Coloque a língua em um formigueiro
insone
e depois me diga algo belo sobre a natureza
dos insetos.

terça-feira, junho 15, 2010

Angustia de influência

Não importa o que você faça,
as pessoas nunca acharão que foi o bastante.
Nós sabemos disso, e ainda sim tentamos fazer de uma forma melhor
De um modo menos cruel
De um jeito mais honesto.
Que certamente será ignorado e pouco.
Não importa a força,
O empenho,
A doçura
Com a qual acalentas o mais belo
Broto de sonho
Ou nome de deusa.
No final serás apenas uma pedra
Encaixada em um caminho de sombra.

domingo, junho 13, 2010

Apresentação de si

Só quem viveu a regra das ruas com a asa manchada
Conhece o peso
De noites sem fim.
Sem tempo para perder com detalhes
Sem energia bastante para se ocupar com a fama
A fome, a fúria e o olhar do carrasco
A velhice e a putrefação dos destroços
No seu encalço
Constante.
É nesse instante que você percebe
Que não importa o que faça
Uma marca invisível lhe foi pregada na testa.
E no fim tudo lhe parecerá inútil
E tolo.
A tristeza vai estar lá
A solidão vai estar lá
A vergonha e a ferrugem de seu
Brio vão estar lá
Como golpes,
A cada segundo exausto de ti
A cada aflição sem nome e calada.

sábado, junho 05, 2010

Cabala cínica

Para dar um corpo a sombras e um nome aos meus riscos
Elaboro as estratégias que sancionarão os meus gritos de loucura.
As raízes marginais, as origens perturbadas, o futuro fétido
E a morte solitária;
Signos arcanos escritos com a lama fedorenta de um bairro detestável
Gotas de chuva inexistente tombam nas carcaças oriundas dessa profunda
Artilharia, dessa foice de sorrisos, dessa exigência de afagos,
Talvez eu te mande um cartão das catacumbas
Adornado com esperança para que chegues atormentada
Aonde eu cheguei.
Aonde eu cheguei, aonde chegamos, onde faremos o que for preciso
Na compreensão intensa de que não nos devemos nada
Senão a cortesia da não exigência,
Aqui seremos em nós mesmos passageiros prestativos
Indiferentes e dispostos a rasgar o tempo
Com sorrisos sem sarcasmo
Com meditações cruéis sobre o coração
De Deus.