sábado, fevereiro 28, 2009

Valsa de Ahasverus

Ela sabe que eu não seria,
não poderia,
e que a circunferência da terra
não tem começo também.
Ela fareja meus sentidos, conheçe os
meus impulsos e nunca me viu
chamando mamãe ou papai.
Ela me avalia, pesa, mede, compara e derruba
a pedra final sobre minha pobre carcaça.
Chorosa, onanista, orgulhosa, decadente e feia
e no entanto
divinamente imaculada e brilhante.
Ela me aponta as amigas,
dissemina o meu dossiê, grita nas praças após eu sair:
"Ele lê Albino Forjaz, Ele ouve Hank Wiliams,
Ele Acha que o Bukowiski, o Fante e o Steinbek são os maiores"
Ele não vai a igreja,
ao samba,
Ao Show de Rock na carlos gomes vestindo
camiseta do Che Guevara, louvando velhos panfletos pendurados
na descarga"
Ela faz tudo isso...
Se afasta das cortinas para lavar os anos que viriam no tanque
na familia, no dia a dia da certeza canonizada de um afeto acinzentado
querendo,
desejando,
ansiando
pela loucura que eu trago na virilha.
Ela vai no dia a dia petrificando-se e esvaindo-se
até o breve rio
da resignação.

sexta-feira, fevereiro 27, 2009

Um corpo irrefutável.

Ela estava colocada a uma distância razoavel, distraida o bastante para não perceber o meu olhar. Seu namorado, marido ou amante a envolvia pela cintura em um abraço que demonstrava posse e orgulho. A exibia com a um troféu, e seu rosto liso e bem barbeado, suas roupas justas e seu carro ponta de linha denuciavam o hábito de extrair muita satisfação dessa exposição social do afeto. Decaido e ciníco demais para esperar do conluio social algo mais que perseguição ou indiferênça eu não teria tais pretensões em relação aquela garota de cintura esguia, seios firmes e olhar distante que ocupava o estreito espaço entre os braços do tacanho garotão. O cabelo cortado na altura do pescoço e o jeito coquete de quem provoca até dormindo, tratando peixe ou lavando roupa estimularia uma batalha árdua, um trabalho delicado de dedos, linguas, suspiros e sedenta invasão. Um sonho de garota, do tipo que nem em meus mais audazes sonhos esperei possuir. Todavia eu era um velho olhando para um outro mundo, um velho cético sobre os grandes espiritos iluminados, casamento, fidelidade e a sublimidade do sublime.
Minha cerveja esquentou e eu pedi outra para o pobre garçom que asfaltava o trecho que lhe cabia no acesso a sucursal do inferno. A rapaziada se refestelava indiferente ao olhar ciníco do velho e careca que observava fascinado a bela dama, suas possibilidades carnais e o regojizo infinito que ela poderia proporcionar a um amante cuidadoso e dedicado, esse seria eu, claro. A bexiga apertou depois da quinta cerveja, um tanto grogue levantei-me e fui ao banheiro que ficava aos fundos. O torpor alccolico, a convergência das imagens, a queda absoluta e a descofiança do si-mesmo eram engolidas pelo tesão intriduzido em meus pensamentos pela visão daquela beldade infante. Onde terminam as planices da poesia? Como redimir aqueles que não foram bastantes astutos para inventar a própria redenção? Lancei um bom jato de urina que demorou uma eternidade, lavei as mãos e saí do banheiro. Parei no contramarco que dava acesso a um quintal do bar e acendi um cigarro, foi quando uma perfmue suave me envolveu e uma mão me tocou o ombro. Ao virar-me ela estava de pé em minha frente. Estremeci de alto a baixo em um impulso adolescente, como se todas as trepadas, recursos aos bregas, desmitificações da feminilidade tivessem se anulado. SUa boca transpirava sexo, seu busto saliente transpirava sexo, o pé de seu umbigo exposto transpirava sexo e eu naquele momento quase acreditei em Deus.

-O senhor poderia me dizer as horas, meu tio?

O aguilhão da realidade atravesou-me o peito e eu lhe dei as costas sem conseguir contornar com algum cinismo aquela veraz acusação. Paguei a conta e fui para casa. Minha mulher assistia televisão de touca na sala e como sempre acusou minha bebedeira. Desssa vez não consegui elaborar honrosamente meu fracasso.

sexta-feira, fevereiro 20, 2009

Ensaio sobre o poder.

Sem falsa modéstia, eu já li quase tudo que existe para ser lido em termos de literatura religiosa. A religião gosta de nos fazer acreditar, de diversas maneiras no poder humano sobre a realidade. Ser feliz em meios as farpas, encontrar um caminho claro no meio de uma selva. Não posso afirmar que levei a sério as disciplinas que a religiosidade coloca como requisito indispensável para chegar a esse poder, e, portanto toda minha retórica pode ser acusada de incompleta, por não ter se submetido ao testemunho da experiência. Em contrapartida, nunca me pareceu uma jogada muito honesta pedir a um sujeito que se debate para não morrer, que é espancado cinco vezes por dia, que cresce nos esgotos mendigando afeto, que acrescente a sua luta a busca por iluminação ou santidade. E eu ainda nem estou filosofando... Minha única refutação é a prudência e tampouco tive uma mãe religiosa para sentir a necessidade de preservar o respeito por algumas palavras quando elas já não tem mais utilidade.
Veja, Prometi a minha filha outro dia, em um acesso redentor, que a levaria em uma viagem. Queria dar-lhe a chance de passar por situações que me foram vedadas pelo cristianismo de quem me criou, um cristianismo de renuncia, reclamações e cerebralidade fria. Prometi, e o ultimo resquício de minha antiga religiosidade é o hábito de me manter escravizado por minhas promessas, então, chegando à data da viagem prometida, mesmo não tendo dinheiro, mesmo vivendo de bicos e submetendo-me a uma dieta de pão com água , eu comprei as passagens com o que trazia guardado a sete chaves para alguma emergência e começamos a nos preparar. A pequena era só ansiedade. Oito anos de perguntas, ensaios para uma identidade e brilho refrescante de uma vida que começa. Olhando-a arrumar diligentemente as suas coisas, ignorante sobre a falta que o dinheiro da viagem ia me fazer, inconsciente do sentimento de vanidade que assalta os velhos diante da alegria, eu me perguntava se não seria uma grande crueldade a vida, mas detive esse pensamento com a mão e o esmaguei como a um inseto.
No dia da viagem tão sonhada minha mulher chegou atrasada do trabalho, e como se um duende maligno estivesse conspirando, não achamos ônibus também para a rodoviária. O desespero de mim se apossou: Quanto vale a decepção de uma garotinha de oito anos? Pegamos um taxi em meio a minhas projeções sobre os cinco meses fazendo hora extra que me esperavam. Parecia-me ter visto impresso no bilhete que o ônibus sairia as onze e trinta e tínhamos então apenas dez minutos quando chegamos a rodoviária. Fui a um caixa eletrônico tirar alguma grana para um lanche e o caixa estava quebrado. Minha mulher blasfemava por eu não ter feito isso antes, mas tínhamos pão com banana guardado na sacola e fomos para o embarque. Achei a plataforma bem vazia, onde estavam todos? Somente nós, em pleno carnaval íamos embarcar? Foi quando percebi que me enganara: O ônibus estava marcado para as 11h15min e já tinha partido. Corri para tentar alcançá-lo na saída, minha mulher e filha vieram atrás de mim. Caíram pães e bananas atrás de nós, as pessoas riam e perdemos nosso ônibus.
Meu coração estava estraçalhado. Não tinha outro ônibus. Não consegui reaver o dinheiro da passagem. Minha filha chorava, minha mulher estava pasma eu...bem, eu não era nada senão um poço de Caos e impotência.

quinta-feira, fevereiro 19, 2009

Chuang Tsé pulando carnaval

Todos desejam destacar-se. Ensaiam gestos, fingem talento, criam cavanhaque, estudam filosofia, escrevem horriveis contos, esboçam algo que pretendem chamar arte ou pulam carnaval. Todos querem destacar-se. Não ser visto, não ser comentado, tornar-se uma palmeira falante em meio ao mundo é a nossa concepção de inferno. Todos querem destacar-se, todavia, ninguém quer ser diferente. Sem novos caminhos, sem novas palavras...A velha estrada e, se possivel, seguindo as marcas de alguém que já passou. A polpa tenra do hálito vital de nossas almas expira sempre, doa de si algo que não tem. Vive em débito perpétuo pois nada produz que sacie a própria fome. Somos Hematófagos de seres feitos de madeira. Mumias celebradas e baterias esquecidas...Mas nos sustentamos do barulho e da aparência do barulho. Perdemos tudo...Perdemos a folha que caiu sobre o teu dedo do teu pé.
"o sábio não explica a questão, mas se revela na clara luz do dia"

segunda-feira, fevereiro 16, 2009

No cais

Eu quero atravessar a rua e não falar.
Eu preciso desse momento sem palavras,
sem a junção esquizofrênica entre a consideração e a ida,
como um bêbado precisa do regurgito e do desmaio,
eu preciso atravessar a rua em vão.
Abandonar a cidade dos motivos sem mapas ou tratados.
deixar-me levar pelos meus passos adormecido e sem sonhos
mas olhando abertamente o riso sepultado das pessoas
em dias translúcidos de chá mate, água fria e mim.
Eu preciso de uma brecha no pensar,
de uma janela no seguir,
de uma desembarcação para o lugar onde cessam direções
e compromissos.
Eu preciso atravessar a rua, sem ser interpretado
querido,
dito
ou esquecido...
Eu só preciso atravessar a rua.

quinta-feira, fevereiro 12, 2009


Blog, auto critica e vaidade flatulenta.

Uma das criticas mais razoaveis a serem feitas a sociedade conteporanêa é a de que ela varreu da face terra a presença da auto-critica. Embora essa observação, por si mesma não seja suficiente para corroborar a tese de que vivemos os piores momentos da história humana, não posso deixar de apontar a guiza de sarcasmo os incidentes que nossa civilização tornou possivel. Um deles é crênça generalizada na natureza democratica do talento. Hoje em dia quase todo mundo acredita-se um artista habilidoso em alguma aréa. A musica é a mais requisitada entre os adeptos dessa crênça. Um rostinho bonito, tocar um instrumento, achar-se "diferente"uma herança artistica familiar e pronto: eis o cantor. Esse fenomêno é um tanto óbvio, não irei portanto deter_me nele. Quero falar de um outro, aparentado desse, mas que me diz respito de uma forma mais estreita. É o fenomêno da internet, e dos blogs em particular.


A internet permitiu que todos os indivíduos tivessem a possibilidade de expor o que produzem ao olhar de outros indivíduos, não importa a natureza dessa produção. Em consequência disso todos passaram a expor, e a querer ser visto. Mas quem iria ver, se todos querem expor? Logo surgiu a solução: as pesoas passaram a visitar os "my espace" "bloggs" e "orkut's" alheios a fim de serem notadas. Aqueles que eram visitados passaram a retribuir as visitas para manter a clientela. E assim todos garantiram olhares e seguiram acreditando que tinham algum tipo de talento em suas planas e óbvias pessoas. O plágio também tornou-se uma constante, e é desesperador perceber como as pessoas são semelhantes a buracos negros que de tão vazios acabam sugando tudo que vêem para tentar preencher-se e seguir acreditando que têm substancia. Eu citaria nomes, mas isso não seria elegante. Todavia é deprimente ver indivíduos tentarem corroborar as próprias auto-imagens através do plágio, da bajulação e do auto engano . É claro que a internet, assim como nossa sociedade, proporciona tantas possibilidades interessantes e ricas que essa perda não chega a ser relevante. Demais, quem defende a democracia a qualquer custo como eu, não pode opôr-se ao livre exercicio da flatulência, mas também não posso deixar de expor o que registra o meu olfato.

Para prosseguir- Ensaio de um pragmatismo romantico 2

Viver entre outras coisas requer paciência e tato. Uma estratégia mais sutil, um desejo melhor articulado, expectativas mais razoáveis e menos exageradas. Veja, se as coisas não correspondem ao que desejamos a responsabilidade sobre o desgosto que daí advém me parece que é muito mais nossa, que escolhemos nossos desejos, que da vida que não os satisfaz. Afinal quem foi que determinou a necessidade absoluta de certos desejos? E quem foi que determinou qual atitude iremos adotar diante do impedimento de obtermos um certo resultado? E, ademais, bater o pé no chão e maldizer forças invisíveis como a sorte, deus, carma, a sociedade ou a biologia e etc não irá ajudar-nos, eu acho, a obtermos o resultado que desejamos. Saúde, controle, satisfação e um certo sentido de maleabilidade e adaptação são as coisas que todos nós mais desejamos, no entanto , elas devem ser dimensionadas de forma que não estrangulem seus próprios projetos.
Todavia, o problema apresenta-se quando percebemos que ninguém tem apenas um desejo e toda escolha que contempla um desejo ,ou um “bem”, implica a desistência de outro. Não percebemos isso quando o desejo contemplado extrapola imensamente todos os outros que possuímos ou não apresenta contradição com estes no momento mesmo da escolha. No momento em que isso ocorre nos encontramos na difícil situação de ter que fazer um escolha sem o referencial necessário para nela nos sentirmos seguros, pois todo referencial só irá apresentar-se APÓS termos feito a eleição de qual bem fundamental irá nortear nossa ação. Agir assim implica possuir os valores citados no inicio desse texto, estes, Não são valores EM SI MESMOS como aqueles divulgados pela religião ou pela bíblia, são valores que me parecem úteis, quando precisamos realizar nossas escolhas e avançar um passo que seja em direção a uma vida mais clara, aberta e sem contradições dramáticas.