sábado, agosto 28, 2010

Nem Jung explica

Cheguei em casa quebrado. A cabeça e os olhos doíam porque a lente direita do meu óculos estava arranhada. Joguei uma água no corpo e entornei meia garrafa de vinho que estava sobrando na geladeira. A casa vazia, a mulher no trabalho e meu vizinho pouco sapiente com o rádio desligado, sem ouvir reggae ou samba. Na televisão era mais do mesmo. Nada que pudesse servir para uma punheta. Mesmo assim consegui arrancar uma das boas, minha memória nunca me deixou na mão, ou melhor, sempre me deixou. (Hehehe) Tombei na cama e comecei sonhar. Eu estava voando. Lá embaixo as pessoas me apontavam e riam. Eu não achava graça nenhuma. Estava de camisa e sem calças e um vento noturno bem friozinho me gelava os testículos. Atravessei algumas ruas assim, feito um balão imbecil balançando pra lá a para cá sem saber de porra nenhuma. Ao chegar a uma auto estrada na saída do bairro onde cresci um vento mais forte me jogou nos fios de alta tensão. Levei um choque dos diabos e acordei com a lateral do corpo doendo. Levantei, era já madrugada e do meu lado a patroa dormia. Levantei, fumei um cigarro e abri a janela. Tudo parado. As pessoas agora também acertavam as contas com suas pegadas. Tudo me pareceu frio e distante. Vago. A substancia do mundo tinha o gosto de algodão doce sem açúcar. Tudo é muito engraçado, mas eu não rio. E você?

terça-feira, agosto 24, 2010

Preâmbulo

Ela tem o jeito louco de quem
não desperdiça tempo.
Com um movimento intenso
de contrações suaves
ocultas e famintas sob a pele.
Ela tem a dor tamanha, o lábio de delicias
o movimento forte de mulher
madura
que aprendeu a ser em meio a
muitas lutas.
Ela possui o brilho de menina inconseqüente
de coisa ou ser aveludado que se dá
e vai
sem me deixar senão a mim.
Preâmbulo de um texto que não se escreveu
e uma mulher linda inexistente
compondo o quadro lindo
que preenche o meu vazio.


segunda-feira, agosto 23, 2010

Deus, amor e todo o resto...

As palavras são velhos esqueletos que desfilam parecendo vivos mesmo depois que seu espírito se foi. Antes falávamos de Deus. Essa palavra tinha o peso de uma sentença e era dosada com o cuidado da dinamite. Hoje o que é essa palavra? Um hábito vazio que não diz nada. Uma pólvora seca com a a qual os excluídos tentam chamar a atenção para sua queda, uma tentativa fracassada de restituição, um remendo para as vidas que estão partidas. O amor, tomou o lugar que antes Deus ocupava na vida das pessoas. Mas assim como a palavra anterior essa também é muito vaga para encarnar-se de forma decisiva em nossas vidas. Deus, Amor, palavras que todo mundo fala mas cujo sentido cada um estabelece ( ou se deixa estabelecer)como bem entende (ou como entendem por nós). Assim, as carências pessoais (variadas que são) encontram nessas palavras um material elástico o bastante para lhes servir de armadura contra a consciência de sua existência. O amor, doravante será interpretado de acordo com a natureza da carência que lhe dá sentido somado a programação que ensina como satisfazer essa carência.

"Quando não realizamos o ideal imaginário do amor, buscamos explicar a impossibilidade culpando a nós mesmos, aos outros ou ao mundo, mas nunca contestando as regras comportamentais, sentimentais ou cognitivas que interiorizamos quando aprendemos a amar"
Jurandir Feire Costa

A palavra Amor, no entanto, permanece. Mesmo que ocorra a variação do seu significado, pois nesse caso ela é colocada no alto de nossa "hierarquia" de valores de onde ela olha de modo acusador para aqueles que nos negam o que nós precisamos. Em outras palavras: Um mundo sem amor é apenas um mundo que não corresponde ao meu conceito, ao meu ideal. Uma pessoa sem amor é apenas alguém que não se adapta ao que espero dela. E porque é a pessoa que precisa estar errada? não será o meu conceito equivocado? Como perceber isso? Quanto sangue não seria poupado, quanta dor se apenas essa pergunta fosse colocada? Mas isso as mães não ensinam as suas filhas. Deveriam.

domingo, agosto 22, 2010

O fim do futebol

O futebol não vai ser proibido,
nem a morte pode deixar de existir.
As igrejas embora toscas, irão receber seus donativos
e as mulheres continuarão exigindo
a canonização do afeto.
Tudo continuará...
o vinho do meu dia arrebentando
os odres velhos de meus contemporâneos,
a revolta opaca do batalhão de ressentidos,
os gemidos,
dos invisíveis que não participam
de nossa aprovação.
Não, o futebol não vai ser proibido,
e a morte não vai ser abolida
dois pontos extremos entre os quais
vocês oscilam
caravana dos defuntos sem o mal-me-quer
do agora.

terça-feira, agosto 10, 2010

Distância e sentido

Amo os teus olhos diluídos

Em um mar vermelho

onde deságuam enxames.

Teus gestos de vestal sem templo ou castidade

Sua pouca inclinação para o sagrado

e sério.

Amo tua mania de inquietações, teu hábito de entrega

Furiosa,

Os segredos gritantes do teu medo

Onde sacio a minha fome de igualdades.

Dessa maneira eu permaneço em mim quando me procuras

Me esquivando com verdades e me oferecendo em silêncios

Onde somos dois irmãos malditos

Permanecidos na lembrança de tardes de partilha

Ocultos na vestimenta dos segredos improváveis

Porque deveria haver sentido nesse mundo,

Porque esse mundo deveria fazer algum sentido.

segunda-feira, agosto 09, 2010

Alegro ma...

Procuro por um Sutra que cale meus tombos

Uma estrutura mais branda,

E a remissão do meu tédio.

Procuro por uma sonata de luz, um breve intervalo

Sutil

Onde possa sentar-me comigo e aceitar essa rigidez

Que me cerca.

Procuro um Alegro ma non Tropo

Um beijo sem memórias e um gesto sem condenações

Sem a tensão dos seus braços, sem a distração do meu jeito

Sem o tudo que tem sido nós dois.

Procuro, já não cabe fingir, o mesmo de sempre

O ponto cego para sentir-me estável

Olhar na face do medo

E beber plenamente

a minha taça de tempo.