Ele vai caminhar pela praia de Itapuã como tantas vezes fez pela orla empobrecida e suja do bairro onde passou a maior parte da sua vida. Não sabe muito bem por que isso lhe provoca um inominado bem estar, nem por que não consegue tornar tal caminhada um hábito. Talvez sejam surtos de solidão feliz que o acometem de forma sazonal, mas ele não pensa nessas coisas. Apenas pega seu boné e sai. No caminho ele vai prestar atenção em coisas que ordinariamente lhe são veladas por temores. Vai observar o semblante das pessoas, vai notar os pequenos vincos em suas testas e compreender, sem no entanto explicar, a aflição de suas vidas. Isso lhe vai lembrar as suas próprias aflições. Ele vai, uma vez ou outra, deixar-se arrastar para o interior confuso de seus medos e desejos. Vai dialogar consigo, exortar-se a adotar uma certa atitude frente ao mundo, vai refutar algumas argumentações de conhecidos e desconhecidos e vai explicar a fantasmas que eles estão errados e porque. Ele também vai rolar na lama de seu passado triste. Vai sentir pena de si mesmo. Vai catalogar cada pequeno evento que o faz superior ao mundo, ou então, simplesmente vai afirmar a própria incompetência para viver. Contudo, nem sempre será dessa maneira. Em alguns momentos breves em que o tempo para, ele apenas estará lá. Observando sem catalogar, sentindo sem acumular, amando sem reter ou segurar. Ele talvez chegue a perceber-se apenas diluído na trama confusa de momentos sucessivos, sem essência, conteúdo ou missão. E as pessoas passarão por ele e ele passará por elas. Depois irá retornar a sua casa para falsificar a vida escrevendo uma vez mais.
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