A poesia deve sair Como um soco Ou então estaremos mentindo. Como as pessoas que escrevem como se fossem arquitetos Medindo, escolhendo, apagando Imaginando o que outras pessoas Dirão ao ver o que eles Fizeram. Mas existem aqueles que escrevem como caçadores no encalço Da aurora. Golpeando a caneta, o teclado Com a poesia brotando das suas entranhas Jorrando e gritando Como um afogado que procura Uma ultima visão Do luar.
Qualquer coisa significa qualquer coisa Quando se quer acreditar. Quando se precisa duvidar Quando se deseja mais controle Para redimir-se de uma vida amarga. Mas as coisas não assim tão simples Meu amor. E eu já ando destroçado desde que Vi a luz do dia. Deixo o troféu da glória para quem procura Paraísos, Abandono a luz da festa sem esperar Aplausos, Não estou caçando estrelas, nem colecionando Amores Apenas sigo vivendo os meus dias Com uma mão aberta para alegrias E uma mala pronta para despedidas. Encontro-me no ponto em que não existem Exigências, Desprezando enxovalhos e ignorando o que desprezo Para prosseguir imaculado Vertendo minha seiva enquanto houverem Cânticos, encanto e amor.
Estarás em perigo Diante de facas a espreita E de amores insanos reivindicando Sua morte. Estarás em perigo por esqueceres as chaves Ou por levar as muitas lembranças Da dor e da perda contigo. Sua pele estará exposta Seu peito estará a mostra E apenas a embriaguês de beijos e corpos Afastará o tremor de suas mãos. Pois Estarás em perigo Sempre estarás em perigo Mesmo com a sombra dos pais Regando com dinheiro e palavras O seu caminho de festas Mesmo com a renuncia em preces Mesmo com o cuidado extremo Mesmo dormindo 8 horas por dia Evitando o álcool O adultério E a sabedoria. Estarás em perigo, como um pássaro sem asas Atravessando O asfalto.
Tinha peitos bonitos E trepava como ninguém. A bunda dela tremia entre meus dedos Quando um deles escorregava Para lá. Nossa foda era das melhores. Apesar algumas vezes Eu estar mais preocupado Com os meus Pensamentos. Era um choque de dois corpos movidos Por duas fomes, dois selos Sobre uma carta para ninguém. Ela tinha um sorriso e talvez escrevesse poemas Tinha pontas de vestido rasgado no porão E uma linda vagina que tremia como O solo de ilhas tropicais Em um terremoto infinito iamos além, uma vez e de novo e de novo e de novo. Eu às vezes fico distante e perco as coisas Mais importantes Mais eu estava ali com ela E o segredo de seu cheiro Ensinou-me acerca do amor. Ensinou-me acerca do amor.
Tomé empilhava caixas. Uma após a outra ele montava pequenas torres nos fundos do depósito do supermercado. Fazia aquele trabalho há algum tempo. Era mecânico e repetitivo. Enquanto empilhava aquelas caixas sonhava com praias, garotas e algum tipo de respeito mas nem imaginava como se poderia conseguir aquilo naquelas circunstâncias . Às vezes , entre um carregamento e outro, ia ao banheiro e aproveitava para fumar um cigarro. Naquele dia havia acabado de fazer isso quando foi chamado ao RH.
Tomé desceu as escadas que ao contrário do lugar em que trabalhava eram limpas e refrigeradas. Andou mais alguns metros até chegar a sala do RH onde uma dona branca, muito maquiada, coberta de bijuterias e um longo nariz de pássaro lhe sorriu apontando um assento.
- Sente-se senhor Tomé.- Disse o pássaro – o senhor aceita um café?
-Não, muito obrigado.
- Bom, não precisa ficar com medo, é uma entrevista de rotina, para avaliar o grau de satisfação de nossos funcionários. Vou lhe fazer algumas perguntas. Seja sincero tá?
- Claro dona.
E ela começou. Se ele gostava do trabalho. Se pensava em promoção. Se o salário satisfazia suas necessidades básicas. Procurou não hesitar demais. Silêncio nestas horas é uma confissão. Tomé lia Marx, Adam Smith, Bakunin e Proudhonmas respondeu a tudo de forma convincente e risonha. O trabalho era ótimo. Em todos os aspectos. Bom mesmo. O salário também era o bastante para o que precisava.
Saiu da entrevista se sentindo muito mal, mas parecia-lhe que tinha convencido o pássaro.
Terminou o batente e mudou de roupa. No caminho até o ônibus imaginou como seria bom encontrar uma garota diferente. Alguém que não lhe cobrasse coisa alguma. Que apenas lhe desse o corpo, o sorriso e o seu tempo sobre a terra sem lhe oferecer risonha uma lamina de barbear para a extirpação do orgulho. Subiu no mesmo ônibus de sempre, cercado das mesmas caras amassadas e sentou-se no mesmo banco de todos os dias. Desceu também no mesmo lugar e viu a fachada da casa alugada em que morava sem perceber que ela estava ficando cada dia mais velha e descascada.
Entrou pelo portão de zinco a abriu a porta de madeira. Na sala sua mulher assistia a uma novela. Naquele momento desenrolava-se uma cena em que a atriz principal descobria que era traída por seu marido. Tomé escorregou pela sala após um “boa noite” mecânico, respondido de forma também mecânica.
- Amor! – Sua esposa gritou da sala enquanto Tomé virava uma cerveja recém saída da geladeira – Se chateia se eu lhe fizer uma pergunta?
- Não, pode falar – Tomé deu outra golada, esvaziou a garrafa, dando um suspiro de olhos fechados desta vez.
- Você me ama de verdade? Quer dizer, você pensa em outras garotas, sente ou já sentiu vontade de dormir com outra mulher? Se isso acontecer é melhor acabar, não importa o quanto seja bom viver com você.
Tomé parou para pensar pela segunda vez. Não podia hesitar. Já tinha lido Carl Rogers, R.D Laing, Freud, Reich, Stirner e Sartre mas respondeu sorridente que jamais tal coisa lhe havia passado pela cabeça. Deu outra golada. Sua mulher continuou assistindo a novela e Tomé entrou no banheiro. A água do chuveiro lhe caiu sobre a cabeça. Ele se sentiu limpo pela primeira vez naquele dia.