quinta-feira, outubro 18, 2007

Uma napoleão, um Bufão.

Não há sensação pior que a solidão e no entanto é a que mais me persegue. Ela sempre vem nos sábados e domingos à noite quando a alegria alheia incomoda a minha vaidade ou quando acordo na segunda pela manhã sem um tostão no bolso e com um imenso espaço do meu lado na cama. Nestas horas um frio que corta o muco do pulmão preenche todo o peito, os pensamentos tornam-se desesperados e inconstantes. A pior solidão que sinto, no entanto por mais contraditório que pareça, ocorre quando estou acompanhado. Eu a estou sentindo agora, enquanto apresento os meus textos e poesias a um conhecido, sentado numa mesa do bar e tomando um copo de vinho. Ele olha o primeiro texto, talvez esteja lendo só o primeiro parágrafo, passa para o segundo, terceiro e quarto e me entrega o maço de folhas, dá um risinho e diz vagamente:
-Parece bom...
Eu só posso pensar com isso que ele não tem a capacidade de avaliar o material e consequentemente fazer uma crítica pertinente. Meu desespero engole e elimina a possibilidade de disfarçar a sensação de isolamento e compreensão do fardo de estar só; quando não encontramos ninguém a nossa altura ( mesmo que ela seja das menores). O vinho continua a encher nossos copos, a conversa é que se torna vaga e fútil, com uma pergunta ou outra sobre dinheiro, trabalho, mulher... A vontade que me dá é levantar da mesa, mas permaneço ali, em silêncio ouvindo aquele papo chato e com a ferida me carcomendo as entranhas, droga! Qualquer um é capaz de dar uma opinião, mesmo que seja superficial e equivocada, tem observações a fazer diante do que lhe surge na frente, no entanto o cara só é capaz de dizer: “Bom”. Por quê? Será para não se dar ao trabalho de pensar a respeito ou por sentir-se de alguma maneira diminuído pela incapacidade de produzir algo semelhante? Não sei. Não me considero um bom escritor, nem um poeta razoável, e a avaliação que faço da criatividade da maioria das pessoas que me cercam também não é das melhores, mas pelo menos eu faço alguma avaliação merda ! Dou a cara pra bater, assumo os riscos. O problema é que lhes falta um fracasso advindo de uma grande tentativa e expressar-se, um sim afirmativo de uma tentativa bem sucedida.
Acho que ele percebeu o meu olhar cínico e desdenhoso e prepara-se para ir embora, eu não o impeço, chego até a ficar satisfeito quando essa solidão me atinge, falar exige um esforço imenso que me esgota e só faz piorar tudo. Ele levanta-se aperta minha mão e eu fico ali sentado bebendo no canto do bar olhando as folhas de papel em cima da mesa e perguntando a elas em silêncio: “para quê eu escrevi vocês?” elas não respondem, ficam apenas ali como se quisessem me dizer que existir lhes bastava, continuo bebendo cada vez mais até que o álcool transforma em fúria a minha tristeza. Eu pego uma das folhas subo na mesa diante dos olhos estupefatos do garçom e dos clientes e começo a recitar:


Há pontos de exclamação por toda parte !
Fincados na esquina do transito apressado
Com olhos bundas, peitos e caralhos
Se matando por um pedaço da carcaça fedorenta
E os vermes que nela se arrastam
Eu também quero o meu pedaço
E foda-se o sufrágio universal!
Um braço forte,uma palavra intensa ou somente
A alegria que todos querem, a felicidade que não podem esconder.
Por trás de seus focinhos nojentos...

Nessa altura o Garçom apavorado fez sinal para dois macacos imensos que começaram a vir em minha direção, enquanto o publico surpreso recebia a tudo em transe. Continuei:

Estampados, na revista caras, frios sobre a laje branca
Suavidade quente e linda do teu corpo...
Porquê não tive?
Ahh, sonho louco de uma utopia que me apodreceu
E ninguém acordou no dia seguinte.
Fui agarrado pela gola e forçado a descer da mesa. Um tapa me acertou a orelha e revidei com um soco direto de esquerda. Acertei em cheio mas o outro gorila me pegou pela cintura me jogando a uns dois metros pela porta afora. Cai na rua com fedor de urina e fiquei esparramado no chão rindo muito. Uns minutos depois levantei, com uma certa dignidade confesso. Fui para casa, um napoleão exilado.

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