A garota mais linda da minha rua tinha olhos impossíveis. Eu tremia só de saber que poderia cruzar seu caminho ao ir para a escola ou comprar pão no final da tarde. Quando jogava futebol com os amigos e ela passava perto da quadra improvisada no meio do asfalto, eu dava um jeito de chutar a bola para longe, com medo de ser visto suado, sem camisa e magro como um iogue. Nas rodas de bate papo minha paixão platônica pela menina era o assunto principal. Todos zoavam de minha timidez e alguns, os mais velhos, davam conselhos.
-Vai lá e chama ela para o escuro. Sentenciava um.
-Manda uma carta – falava outro.
Eu ficava calado, fingindo riso, tentando descaracterizar a certeza acerca de minha idolatria silenciosa. Enquanto isso, secretamente eu me tornava amigo do irmão da garota. Trocávamos gibis e conversávamos sobre coisas que normalmente não me interessariam. Era uma estratégia de aproximação sutil, sem muitos riscos. Acabei conseguindo me tornar amigo dela. Toda noite meus passos tinham destino certo. Eu a encontrava em sua porta, a pretexto de falar com seu irmão e ficávamos horas conversando, na verdade ela é que conversava, eu ouvia maravilhado como um devoto que encontrou seu deus face a face. Fui tomando coragem. Finalmente ia lhe confessar meus sentimentos, mas algo inusitado aconteceu.
Uma noite fui confiante encontrar minha pequena sacerdotisa e para minha surpresa ela não estava. A coisa repetiu-se algumas vezes, até que um dia estava com os rapazes da redondeza na roda de bate papo, cada um narrando suas bravatas, enquanto eu calado a um canto remoia pressentimentos sobre minha garota de olhos incríveis. Foi quando chegou o Arnold, o maior contador de vantagem de todo subúrbio. Também treinava boxe e costumava ameaçar os garotos mais fracos. Ele sentou na roda, acendeu um cigarro (também era o único que já fumava) e com um sorriso sádico ao canto da boca falou:
-Sabem quem eu estava traçando?
Silencio total. Todos estavam aflitos para saber quem era a mais nova vitima do carnossauro (era assim que o chamávamos as escondidas).
-A nana, irmã do Cadú.
Meu coração explodiu. As lagrimas quase vieram aos olhos. Todos os olhares se dividiam entre ele e eu, eles sabiam o que significava cair nas garras do Arnold, que não parou por aí e continuou a descortinar seus espólios de guerra.
- Franguinha safada ! verdadeira putinha, gosta de apanhar e de gozar pelo cú !
Foi o cúmulo. Olhei para ele com raiva e sai correndo, as lagrimas caíram no caminho. Os outros rapazes ficaram gargalhando. Daí em diante não freqüentei mais as rodas de bate papo do bairro. Fui me isolando, me restringindo ao mundo dos livros e as ocasionais incursões noite adentro pelas ruas sozinho quando cresci mais um pouco. Tinha apenas doze anos nessa época. Durante algum tempo ainda tive noticias da nana, ela casou-se com um traficante das redondezas e dizia-se que apanhava bastante. Pouco depois meu pai de criação morreu e eu fiquei só no mundo. Tive varias mulheres. Cada uma mais escrota que a outra, mas nunca esqueci totalmente minha garota de olhos incríveis. Um dia a encontrei. Parecia um bagaço mastigado e cuspido por milhares de bocas. Duas olheiras tatuadas como lapides do que já tinham sido olhos lindos. Não tive coragem de lhe dirigir a palavra. É verdade que já tinha trepado coisas piores, mas não consegui nem lhe cumprimentar. Algo morto de mim se refletia no seu rosto. Entrei no bar e pedi uma dose. Terminei a noite bêbado e coberto de vômito, com esse conto amarrotado entre os dedos.
-Vai lá e chama ela para o escuro. Sentenciava um.
-Manda uma carta – falava outro.
Eu ficava calado, fingindo riso, tentando descaracterizar a certeza acerca de minha idolatria silenciosa. Enquanto isso, secretamente eu me tornava amigo do irmão da garota. Trocávamos gibis e conversávamos sobre coisas que normalmente não me interessariam. Era uma estratégia de aproximação sutil, sem muitos riscos. Acabei conseguindo me tornar amigo dela. Toda noite meus passos tinham destino certo. Eu a encontrava em sua porta, a pretexto de falar com seu irmão e ficávamos horas conversando, na verdade ela é que conversava, eu ouvia maravilhado como um devoto que encontrou seu deus face a face. Fui tomando coragem. Finalmente ia lhe confessar meus sentimentos, mas algo inusitado aconteceu.
Uma noite fui confiante encontrar minha pequena sacerdotisa e para minha surpresa ela não estava. A coisa repetiu-se algumas vezes, até que um dia estava com os rapazes da redondeza na roda de bate papo, cada um narrando suas bravatas, enquanto eu calado a um canto remoia pressentimentos sobre minha garota de olhos incríveis. Foi quando chegou o Arnold, o maior contador de vantagem de todo subúrbio. Também treinava boxe e costumava ameaçar os garotos mais fracos. Ele sentou na roda, acendeu um cigarro (também era o único que já fumava) e com um sorriso sádico ao canto da boca falou:
-Sabem quem eu estava traçando?
Silencio total. Todos estavam aflitos para saber quem era a mais nova vitima do carnossauro (era assim que o chamávamos as escondidas).
-A nana, irmã do Cadú.
Meu coração explodiu. As lagrimas quase vieram aos olhos. Todos os olhares se dividiam entre ele e eu, eles sabiam o que significava cair nas garras do Arnold, que não parou por aí e continuou a descortinar seus espólios de guerra.
- Franguinha safada ! verdadeira putinha, gosta de apanhar e de gozar pelo cú !
Foi o cúmulo. Olhei para ele com raiva e sai correndo, as lagrimas caíram no caminho. Os outros rapazes ficaram gargalhando. Daí em diante não freqüentei mais as rodas de bate papo do bairro. Fui me isolando, me restringindo ao mundo dos livros e as ocasionais incursões noite adentro pelas ruas sozinho quando cresci mais um pouco. Tinha apenas doze anos nessa época. Durante algum tempo ainda tive noticias da nana, ela casou-se com um traficante das redondezas e dizia-se que apanhava bastante. Pouco depois meu pai de criação morreu e eu fiquei só no mundo. Tive varias mulheres. Cada uma mais escrota que a outra, mas nunca esqueci totalmente minha garota de olhos incríveis. Um dia a encontrei. Parecia um bagaço mastigado e cuspido por milhares de bocas. Duas olheiras tatuadas como lapides do que já tinham sido olhos lindos. Não tive coragem de lhe dirigir a palavra. É verdade que já tinha trepado coisas piores, mas não consegui nem lhe cumprimentar. Algo morto de mim se refletia no seu rosto. Entrei no bar e pedi uma dose. Terminei a noite bêbado e coberto de vômito, com esse conto amarrotado entre os dedos.
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